Imprimir E-mail

Associação Nacional de Livrarias completa 40 anos


No futuro, o livro  tradicional continuará sendo uma ferramenta importante para o conhecimento e caberá às livrarias se adaptarem à  competição de outros canais de venda mostrou  o Seminário A Sociedade do Conhecimento e o Livro como Ferramenta  no aniversário de 40 anos da ANL.

 

Players do mercado do livro no debate com palestrantes do seminário no auditório da  Fecomércio SP

 

Ao abrir o evento, nesta terça, 9, Bernardo Gurbanov, da Livraria Letra Viva, recordou sua chegada ao Brasil, vindo da Argentina, em 1977, um ano antes da fundação da entidade, hoje presidida por ele em seu segundo mandato consecutivo.

Elogiou os livreiros que o antecederam na presidência da ANL; “todos fizeram o bom combate pelas causas do setor” e anunciou que a próxima Convenção Nacional de Livrarias, em agosto em São Paulo, terá como tema O Ecossistema do Livro.

Bernardo disse que o Manual de Boas Práticas para o Setor Livreiro, lançado em seu primeiro mandato, mostra os interesses de cada categoria do mercado pensados como um ecossistema. Para ele, o mais estarrecedor, hoje, é ver os seus fornecedores venderem direto para os clientes de livrarias.

A Lei do Preço Fixo,  em tramite no Congresso, que muitos acreditam poder regular esse sistema, tem ,segundo Bernardo “perspectivas nebulosas de aprovação”, e mesmo se aprovada terá de enfrentar a tradição dos países latino americanos em desrespeitar leis, lembrou ele.

Além de Bernardo, estavam presentes no Seminário os ex-presidentes da ANL, Vitor Tavares, da Livraria Loyola (SP), hoje diretor suplente da entidade e Armando Antongini Filho, que está fora do mercado livreiro. O também ex-presidente Ednilson Xavier, Livraria Leitura (PE) , hoje vice-presidente financeiro  da ANL, enviou um vídeo onde felicitou os livreiros pela data.

Embora comemorasse 40 anos da entidade, o evento teve como melhor atração a palestra sobre o que está por vir  a cargo do dinamarquês Peter Kronstrom diretor do Copenhagen Institute for Futures Studies, com suas previsões sobre a Sociedade do Conhecimento, que deu nome ao Seminário.

Há 11 anos no Brasil , ele  explicou em português, com ocasionais palavrões bem humorados, que sua entidade estuda o futuro no plural por se referir às muitas possibilidades que irão surgir. Mas não tem dúvida de que o livro terá um futuro brilhante, embora com muita competição.

“O futuro é agora, não é um bicho estranho que vem de fora”, disse, lembrando que estudar o amanhã é da natureza humana e que 80% dos pensamentos de uma pessoa durante o dia estão relacionados ao futuro; “temos de ser protagonistas e não vítimas dele”, alerta.

Para entender o que está por vir há que conhecer as tendências mas principalmente, segundo Peter, as megatendências  que têm duração entre 10 e 15 anos.  A Sociedade do Conhecimento é uma delas, onde deixamos de ser especialistas, como antes,  para sermos neo-renascentistas num constante processo de aprendizado onde o livro é fundamental.

Mas há fatores disruptivos nas megatendências, chamados Cisnes Negros, como tsunamis, vulcões, a própria internet e, nunca houve tantos Cisnes Negros como em nossa época. Peter mostra que o surgimento das fake news, por exemplo,  descredibiliza a internet e é ponto a favor das tradicionais  fontes de informação, mais confiáveis, como o livro.

“Tudo está se transformando em uma enorme Disneylândia”, diz ele; “ Uma das comunidades que mais cresce no FaceBook é dos que acreditam na teoria da Terra Plana”.  E isso  fortifica o livro como fonte da informação  segura e aprofundada.

A Dinamarca, pais do palestrante, é  um dos mais digitalizados no mundo,  mas nenhum estudo mostrou aumento na eficiência do sistema educativo alí graças às novas tecnologias. Aumentou foi o número de crianças com problemas psicológicos por causa delas, diz ele.

“Dar um smartphone a uma criança é como dar cocaína, provoca uma intoxicação digital” alertou. E lembrou que Steve Jobs e Bill Gates matricularam  seus filhos em uma escola na Califórnia que não faz uso dessas tecnologias.

“Vamos ter uma imensa onda de pessoas que vai se desligar, ficar off-line” profetiza. Ele crê  que isso abrirá espaço para o livro, que não tem publicidade ou o ruído da internet. Contabiliza estarmos expostos a entre 4 e 10 mil anúncios publicitários por dia, a partir das marcas que usamos.

O livro também poderá conquistar espaços  naquelas frações de tempo liberadas pelas máquinas como a que se gasta para dirigir no trânsito, já que em breve, segundo Peter, 50% da frota de automóveis nas grandes cidades será guiada por robots.

Nos novos tempos, onde outra megatendência é a individualização cada vez maior e a constante transformação, o livro continuará sendo ferramenta de ponta pois, segundo ele, quando alguém compra um livro está apostando no futuro.

Juliana  Ribeiro, diretora da Allure Consultoria, sucedeu Peter Kronstrom no Seminário e corroborou os questionamentos feitos acerca das novas  tecnologias afirmando que elas têm causado mudanças não só em nossa rotina, mas em nossos sentimentos e em nosso corpo.

“Houve aumento significativo nos casos de miopia relacionados ao uso dessas tecnologias” afirmou  e, “ estamos formando uma geração de corcundas”, pelo fato das pessoas caminharem com os olhos voltados para smartphones.

Quando um vídeo programado a ser exibido durante a palestra não pôde ser mostrado por um problema técnico, Juliana prosseguiu imperturbável  assinalando as vantagens que o ser humano tem  sobre as tecnologias, como o jogo de cintura.

Através de fotos  mostrou que nas próprias redes sociais  há uma tendência das pessoas fazerem selfs lendo livros para reafirmarem um estilo de vida saudável, menos agressivo e sem os efeitos colaterais dos equipamentos tecnológicos.

Um estudo examinou o cérebro de indivíduos que leram um romance de enredo complexo e mostrou, de acordo com fotos apresentadas por Juliana, que mesmo uma semana após o término do  livro o cérebro das pessoas  mantinha reações em áreas despertadas pela leitura.

Juliana, que já participou de duas Convenções da ANL,  com sua  visão sobre a venda de livros nas livrarias, afirmou que o principal hoje é fazer a curadoria certa porque o cliente não pode perder tempo e não adianta querer  “ vender carne para vegetariano”.

Disse que a grande tendência no mercado de varejo é a Big Data, que mostra como o cliente está se comportando e permite lhe oferecer o produto mais adequado. Concluiu alertando que o livreiro deve meditar sobre o quanto está contribuindo para a ausência do cliente na sua loja.

O Seminário, para uma platéia de representantes do mercado e entidades ligadas ao livro no auditório da Fecomércio paulista,  teve um panorama das vendas apresentado pela empresa alemã de pesquisa de mercado GFK, que tem parceria com a ANL para produzir boletins mensais.

No último, de março, o mercado de livros apresentou uma contínua melhora no desempenho com relação ao mesmo período no ano passado com aumento de 8,8%, como relatou Fabio Assunção, gerente de negócios da empresa.

O livro físico detêm 99,9% por cento das vendas, mas o livro digital está, segundo Fábio, crescendo numa porcentagem de três dígitos, embora quando questionado na platéia não tenha especificado quanto.

A pesquisa informa que o áudio book ainda não decolou no Brasil. As livrarias continuam como maior canal de vendas de livros com 92% do mercado mas cresce a compra no e-commerce de outros canais de vendas.

Antes do encerramento, com um almoço, o Seminário teve a palestra da economista da Fecomércio Fernanda Della Rosa, autora do livro  Participação nos Lucros e nos Resultados – a grande vantagem competitiva ,  lançado pela Nova Editora e a caminho da quinta edição.

Ela fez uma exposição sobre o gerenciamento de pequenas empresas se atendo aos Cinco Pilares da Gestão Empresarial; estratégia empresarial, finanças, administração, gestão de pessoas e marketing, sem contudo se deter nas especificidades das pequenas empresas do ramo livreiro.

Bernardo Gurbanov  disse que sua livraria a Letra Viva deixou de ser uma pequena empresa e hoje  é uma nano livraria. Já a livreira Heloisa Souza    comentou, depois do almoço,  ter uma livraria também chamada Letra Viva que diz ser grande para sua cidade São João da Boavista, de 80 mil habitantes, no interior de São Paulo.

Informada de que no Rio de Janeiro há  outra Letra Viva planejou  combinar com os livreiros de dizerem que formam uma rede. A sua livraria é a única vender literatura geral na cidade, que faz divisa com Minas Gerais, e que tem apenas uma outra livraria, especializada em esoterismo.

Hoje o forte da  Letra Viva são joanense  é a literatura infantil, que ganhou mais espaço e aumentou o faturamento da loja onde inclusive  há um banheiro adaptado às necessidades do público mirim.

Mas Heloisa  está indignada com a loja  Americanas Express recém aberta na cidade  que vende o livro Crônicas de Narnia por R$ 20 enquanto ela, que paga R$ 68 por um exemplar, vende por R$ 99;  “Por isso, a regulamentação do preço do livro é fundamental”, conclui.

Também reclama da tributação de 7,55% sobre o preço de cada produto  da loja mesmo sendo uma empresa na categoria Simples. Segundo um advogado tributarista contratado por ela, o livro não pode ter essa taxa, que é inconstitucional e da qual as editoras estão liberadas.

Heloisa, que está no mercado de livros há 42 anos, dois anos antes da fundação da ANL diz participar das atividades promovidas pela entidade desde o início e foi  a São Paulo unicamente para o evento, mas acha que deveria haver temas mais específicos para fortalecer a classe dos livreiros.

Além destes, o seminário teve a presença de editores e distribuidores como José Henrique Guimarães, da distribuidora Acaiaca, com sede em Belo Horizonte. Para ele, o setor está carente de encontros como o promovido pela ANL, válido a partir do networking que faz entre os players do mercado. “Temos de ser tolerantes com as falhas”, diz ele, que durante quatro anos foi presidente da Câmara Mineira do Livro.

 

10/05/2018